19 de agosto de 2012

Os rodeios e a jurisprudência paulista sobre as práticas que submetem animais a crueldade, por Fausto Luciano Panicacci


Apesar da aceitação da população, as provas de rodeio têm gerando polêmica na jurisprudência, tendo o Tribunal de Justiça de São Paulo já decidido pela vedação total ou parcial das citadas provas.


RESUMO


No presente artigo [1], proponho algumas bases para discussão da ocorrência, nas denominadas “provas de rodeio”, de submissão de animais a crueldade – prática vedada pela Constituição da República. A matéria rende acalorados debates, que não raro desviam do foco fundamental, com defesas que, na impossibilidade de refutar o teor contundente de estudos técnico-científicos – e a inevitável incidência do princípio da precaução – não raro buscam apresentar pretensos argumentos “econômicos”, “sociais” ou mesmo “culturais” em defesa dos rodeios. Analiso, ainda, tendência de consolidação da posição do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – mormente após a criação da Câmara Reservada ao Meio Ambiente - no sentido de proibir, total ou parcialmente, os rodeios.




1 – Das modalidades abrangidas pelo rodeio e dos instrumentos utilizados


Quando se fala em rodeios, vêm à mente, em regra, imagens de sua forma mais conhecida e tradicional, qual seja, a montaria. No entanto, diversas outras práticas têm sido utilizadas.

O denominado “circuito de rodeio completo” costuma conter, com algumas variações[2]:

a)                              calf roping: impiedosamente, são laçados bezerro de tenra idade – com apenas 40 (quarenta) dias de vida – prática que causa lesões e até mortes nos animais; o bezerro, ao ser laçado, é tracionado no sentido contrário ao qual corria; na seqüência, é erguido pelo peão e atirado violentamente ao solo, sendo três de suas patas amarradas; como a contagem de tempo conta pontos, os movimentos são bruscos, levando a sérios lesionamentos;

b)                             team roping: trata-se da chama “laçada dupla”, na qual um peão laça a cabeça de um garrote, enquanto outro laça as pernas traseiras; na seqüência, o animal é literalmente “esticado”, o que ocasiona danos na coluna vertebral e lesões orgânicas;

c)                              bulldogging: com o cavalo em galope, o peão dele se atira sobre a cabeça de garrote em movimento, o agarra pelos chifres e torce violentamente seu pescoço; há, assim, deslocamento de vértebras, rupturas musculares e lesões advindas do impacto na coluna vertebral;
d)                             vaquejadas: dois peões, em cavalos à galope, cercam garrote em fuga; um dos peões traciona e torce a cauda do animal – que pode até ser arrancada – até que este tombe, ocasionando fraturas e comprometimento da medula espinha;

e)                              montarias: divididas nas sub-modalidades “montaria cutiana”, “bareback” e “sela americana”, consistem em montar o peão animal (eqüino, bovino ou muar) e sobre ele se manter enquanto salta, sendo comum o uso de esporas, sedém, sinos, peiteiras e choques elétricos, instrumentos utilizados para deixar o animal assustado e nervoso, bem como para submetê-lo a dor, o que faz com que corcoveie.

No que tange aos instrumentos utilizados, destaca-se, em primeiro plano, o sedém que, como a própria definição revela, é um  “cilício de cerdas ásperas e mortificadoras”[3]

O sedém e similares – qualquer que seja o material constitutivo – são comprimidos contra a virilha dos animais, causando grave sofrimento. Nesta linha uma série de estudos realizados por profissionais das mais renomadas Instituições de Ensino do país:

“A utilização de sedém, peiteiras, choques elétricos ou mecânicos e esporas gera estímulos que produzem dor física nos animais, em intensidade correspondente à intensidade dos estímulos. Além de dor física, esse estímulos causam também sofrimento mental aos animais, uma vez que eles têm capacidade neuropsíquica de avaliar que esses estímulos lhes são agressivos, ou seja, perigosos à sua integridade”[4]

“O sedém é aplicado na região da virilha, bastante sensível já por ser de pele fina mas, principalmente,  por ser área de localização de órgãos genitais. No caso dos bovinos, o sedém passa sobre o pênis e, nos cavalos, pelo menos compromete a porção mais anterior do prepúcio. (…) Quanto à possibilidade de produção de dor física  pelo uso do sedém, a identidade de organização das vias neurais da dor no ser humano e nos animais é bastante sugestiva de que eles sintam,sim, dor física. O contrário é que não se pode dizer, isto é, nada existe, em ciência, que prove que os animais não sentem dor com tal procedimento” [5]

Também com esporas são cruelmente feridos os animais nas provas de montaria. Com a necessidade de fazer com que os animais corcoveiem, bem como por “contar pontos” o desempenho do peão no que tange aos golpeamentos, são os animais de montaria verdadeiramente massacrados com tais objetos, duramente golpeados pelo montador [6].

Em resposta a quesito específico (se “outros instrumentos tais como esporas, mesa da amargura, sinos, peiteiras e assemelhados causam sofrimento aos animais?”) o perito e Prof. Dr. Dirceu de Bortoli, relatando militar há mais de 24 (vinte e quatro) anos como médico veterinário e acompanhar rodeios em diversas cidades do interior paulista, afirma:

“estes instrumentos são causadores de lesões de vários tipos e intensidades, desde lesões inflamatórias, edematosas até as cortantes ou escarcificantes, estas últimas facilmente diagnosticáveis (...) além dos danos físicos, alguns são torturadores mentais, como por exemplo os altos níveis de ruído, manejo inadequado, choques e cutucões, etc.”[7]

Em resposta ao mesmo quesito, assim se manifestou o Prof. Dr. Flávio Prada:

“sim, inclusive a ‘corda americana´, similar ao sedém. As esporas, mesmo as de pontas rombas, são instrumentos causadores de lesões/ferimentos tanto na região cutânea como em tecidos mais profundos, como é o caso dos músculos, mesmo quando não causem lesões externas visíveis. As esporas eventualmente também podem causar perfuração do globo ocular, quando o animal movimenta a cabeça lateralmente, coincidindo com os golpes de esporas do peão, que desfere esses golpes também em relação ao pescoço do animal.”[8]

No rodeio são, assim, utilizados recursos para que os animais demonstrem reações as mais diversas, concluindo-se que “a identidade de organização morfo-funcional existente entre o sistema nervoso do homem e dos animais é altamente sugestiva de que os animais vivenciem sofrimento físico e mental, quando submetidos aos procedimentos do chamado rodeio completo”[9]

Mas não só as montarias são danosas. Vanice Teixeira Orlandi[10] esclarece:

(Sobre calf roping):“O laço que atinge o pescoço do animal o faz estancar abruptamente, sendo tracionado para trás, em sentido contrário ao que corria. Ele então é erguido do solo até a altura da cintura do peão, que o atira violentamente ao chão, sendo três de suas patas amarradas juntas”.
(Sobre team roping) Um peão laça a cabeça de um garrote enquanto outro laça suas pernas traseiras; em seguida, os peões o esticam entre si, resultando em sérios danos à coluna vertebral e lesões orgânicas, já que o animal é tracionado em sentidos opostos”.

(Sobre bulldogging)“O peão desmonta de seu cavalo em pleno galope, atirando-se sobre a cabeça do animal em movimento, devendo derrubá-lo ao chão, agarrando-o pelos chifres e torcendo violentamente seu pescoço. Ocorre assim, deslocamento de vértebras, rupturas musculares e diversas lesões advindas do impacto”.

Como não poderia deixar de ser, a evidente crueldade não tem escapado à atenção do Judiciário paulista, crescentemente provocado pelo Ministério Público ou organizações da sociedade civil em ações civil públicas, e mesmo por cidadãos, isoladamente, em ações populares.
Assim é que a Corte Paulista tem decidido:

“(...) a utilização de peiteiras, sinos, choques elétricos e mecânicos, esporas e outros causam, indubitavelmente, sofrimento aos animais – aliás, a questão foi objeto de parecer oriundo da Universidade de São Paulo (...)” (TJSP, Apelação Cível n. 143.729-5/9, rel. Des. Geraldo Lucena, v.u.).
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Obrigação de não fazer – Abstenção do uso de sedém, confeccionado com qualquer material, nos espetáculos de rodeio – Admissibilidade – Recurso parcialmente provido” (Apelação Cível n. 122.093-5/1, rel. Des. Clímaco de Godoy, v.u.).

"Conforme vem sendo decidido por este Tribunal, os instrumentos utilizados para que os animais, sejam bovinos ou eqüinos, pulem ou corcoveiem durante os eventos de rodeio, impõem sofrimento, dor, tortura e crueldade. E tal prática deve ser afastada. A Lei Ordinária n° 10.519, de 17 de julho de 2002, diz com todas as letras que os apetrechos técnicos utilizados nas montaria, bem como as características do arreamento, não poderão causar injúrias ou ferimentos aos animais e devem obedecer às normas estabelecidas pela entidade representativa do rodeio, seguindo as regras internacionalmente aceitas. Acrescenta ainda a lei, no § 1o de seu artigo 4o, que ‘as cintas, cilhas e as barrigueiras deverão ser confeccionadas em lã natural com dimensões adequadas para garantir o conforto dos animais’ e veda, no § 2o, 'o uso de esporas com rosetas pontiagudas ou qualquer outro instrumento que cause ferimentos nos animais, incluindo aparelhos que provoquem choques elétricos'. Ora, o instrumento sedem, como cediço, visa produzir estímulos dolorosos nos animais, sendo, por isso, irrelevante o material com o qual é confeccionado. A função de tal instrumento é pressionar a virilha, o saco escrotal, o pênis e o abdômen do animal, provocando a dor e o sofrimento, que por sua vez levam o animal a pular, a corcovear, conforme já reconhecido por este Tribunal na Apelação Cível n° 122.093.5/1.00 (Rei Des. Clímaco de Godoy) e Agravo de Instrumento n° 328.048.5/9.00 (Rei. Des. Sérgio Godoy), ambos da 04ª Câmara de Direito Público. Como a lei federal veda instrumentos que possam causar injúrias ou ferimentos, a lei estadual 10.494/99 (anterior), na parte em que admite a utilização de sedem, está revogada. Aliás, autorizar-se a utilização do sedem, desde que confeccionado em material que não fira o animal é o mesmo que autorizar seu uso independentemente de qualquer restrição, pois a questão exigiria constante fiscalização por parte do Ministério Público e dos órgãos de proteção à vida animal, o que, a toda evidência, é de impossível execução. Além do mais, todos os demais itens apontados na inicial transgridem a lei e não podem ser realmente utilizados, por caracterizar maus tratos aos animais." (TJSP, Apelação Cível 539.402-5/9, Rel. Des. Samuel Junior, j.29.11.2007).

E, em recentíssimo e extenso voto, que bem consolida a posição do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, propugna o Desembargador Renato Nalini:

“A atividade do rodeio submete os animais a atos de abuso e maus tratos, impinge-lhes intenso martírio físico e mental, constitui-se em verdadeira exploração econômica da dor, e por isso, não fosse a legislação constitucional e infraconstitucional a vedar a prática, e ela deveria ser proibida por um interesse humanitário, pois, como bem observou o MINISTRO FRANCISCO REZEK no julgamento do Recurso Extraordinário que proibiu a ‘Farra do Boi’ em Santa Catarina, ‘com a negligência no que se refere à sensibilidade de animais anda-se meio caminho até a indiferença a quanto se faça a seres humanos. Essas duas formas de desídia são irmãs e quase sempre se reúnem, escalonadamente.’ Ainda que se invoque a existência de uma legislação federal e estadual permissiva, a única conclusão aceitável é aquela que impede as sessões de tortura pública a que são expostos tantos animais. Primeiro porque a lei não elimina o sofrimento. (...) Depois, existe norma mais recente, a Lei Estadual n° 11.977/05, que instituiu o Código de Proteção aos Animais do Estado, e dispôs expressamente em seu artigo 22 que ‘São vedadas provas de rodeio e espetáculos similares que envolvam o uso de instrumentos que visem induzir o animal à realização de atividade ou comportamento que não se produziria naturalmente sem o emprego de artifícios.’  A competência para legislar sobre meio ambiente, no que se inclui evidentemente a proteção aos animais, é concorrente entre a União, Estados e Distrito Federal, todavia, caso as normas estaduais sejam mais restritivas que as federais, estas cedem espaço àquelas, pois, em matéria ambiental, sempre há de ser aplicada a regra mais protetiva. E é evidente que os animais utilizados em rodeios estão a reagir contra o sofrimento imposto pela utilização de instrumentos como esporas, cordas e sedem. A só circunstância dos animais escoicearem, pularem, esbravejarem, como forma de reagir aos estímulos a que são submetidos, comprova que não estão na arena a se divertir, mas sim sofrendo indescritível dor.

Não importa o material utilizado para a confecção das cintas, cilhas, barrigueiras ou sedem (de lã natural ou de couro, corda, com argolas de metal), ou ainda, o formato das esporas (pontiagudas ou rombudas), pois, fossem tais instrumentos tão inofensivos e os rodeios poderiam passar sem eles. Em verdade, sequer haveria necessidade dos laudos produzidos e constantes dos autos para a notória constatação de que tais seres vivos, para deleite da espécie que se considera a única racional de toda a criação, são submetidos a tortura e a tratamento vil. (...) O homem do milênio, Francesco de Bernardone, que se  tornou conhecido como Francisco de Assis, chamava todas as criaturas de irmãs. Em pleno século XXI, há quem se entusiasme a causar dor a seres vivos e se escude na legalidade formal para legitimar práticas cujo primitivismo é inegável.” (TJSP, Apelação Cível n. ° 9229895-64.2003.8.26.0000 -Rel. Des. Renato Nalini, j. 10.11.2011)




2 - Da inaceitabilidade da tese de que seria o rodeio “manifestação cultural” brasileira

Em não poucas oportunidades, seja em defesas apresentadas em Juízo, seja quando questionados pelos meios de comunicação, organizadores e partidários da realização dos rodeios procuram sustentar que tais eventos seriam legitimas “manifestações culturais”, pelo que deveriam ser não só toleradas, como, inclusive, incentivadas.
Não é o caso. As diversas modalidades compreendidas no “circuito completo” - é por demais sabido - foram há não muito “importadas” da cultura dos Estados Unidos da América. De fato, basta observar que os próprios nomes das modalidades (“calf roping”, “bulldogging”, etc.) são apresentados em Língua Inglesa.

Nos eventos, os peões ostentam vestimentas que nada têm que ver com as tradições do campo brasileiro, apresentando-se com jaquetas de couro com franjas (incompatíveis até com o tropical clima do Brasil), e cintos de enormes fivelas (em regra, com inscrições em Inglês), em visual assemelhado ao dos cowboys do “Velho Oeste” americano, popularizados nos filmes (também americanos) ditos “western” – e nada parecido com o do legítimo sertanejo ou caipira brasileiro. Aliás, diga-se de passagem, o “espetáculo” se desenvolve ao som de musica country (também norte-americana).
A par disso, as “demonstrações” que têm vez e lugar na arena de rodeio passam distante – e muito –das práticas rurais do Brasil.

Não faz parte do cotidiano do homem do campo brasileiro a realização de montarias voltadas, única e exclusivamente, a aferir o desempenho de um humano em se manter sobre animal que corcoveia ao ter um sedém contraindo a virilha e esporas cravadas na região do pescoço.[11]
Também não faz parte do cotidiano deste homem do campo a prática de laçadas de bezerros de poucos dias de vida. Em caso de necessidade de imobilização (v.g., para a cura de ferimentos ou aplicação de vacinas), os animais são “tocados” até currais (esta sim, tradição “boiadeira”, arraigada na cultura nacional) e conduzidos a “seringas”, corredores estreitos que permitem a imobilização necessária.

Tampouco faz parte do referido cotidiano a derrubada de animais ao solo (muito menos por peão que sobre ele salte, de cima de eqüino), ou a laçada em que tal animal é “esticado” (como no “team roping”), posto que tais práticas colocam em risco a incolumidade física e a vida dos animais - algo nada desejado por quem retira seu sustento da comercialização daqueles.

Aliás, e ainda que por hipótese se constate que em pontos isolados do ambiente rural se utilizem tais técnicas catastróficas de lida com animais, forçoso reconhecer que se tratam de práticas inadequadas. E, de qualquer forma, tais práticas (isoladas), bem como outras não menos cruéis (como castrações sem aplicação de anestésicos), se ocorrem, não podem permitir a justificação de espetáculo, no qual se explora a dor animal. É dizer, não pode uma prática cruel ser utilizada para justificar outra. Nesta linha, aliás, a ponderação do Exmo. Sr. Doutor Lineu Peinado, em voto proferido em julgamento, pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, no qual se apreciava justamente o argumento “histórico” sustentado em defesa dos rodeios:

“Os argumentos históricos devem ser levados em conta para compreensão da história de nosso povo e não para determinar uma conduta futura. Assim fosse e estaríamos a defender golpes de Estado e guerrilhas, situações já registradas por nossa história”. (TJSP, Agravo de Instrumento n. 77.320-5/7, Rel. Des. Lineu Peinado).

Tratando especificamente de afastar o “argumento histórico” ou “cultural” no caso dos rodeios, o voto do Desembargador Renato Nalini:

“Tampouco convence a alegação de que a festa de rodeio é apenas um esporte ou ainda uma tradição do homem do interior, como se isso justificasse a crueldade contra animais. As festas hoje realizadas em grandes arenas, com shows, anunciantes e forte esquema publicitário, nada têm de tradicional, no máximo constituem exemplo de um costume adotado por parcela da população - essa sim prática reiterada e difundida - de copiar e imitar estrangeirices, o country da cultura norte-americana. Sua proibição - no que tem de martirizante aos animais - não causará dano algum à cultura bandeirante ou nacional.” (TJSP, Apelação Cível n. ° 9229895-64.2003.8.26.0000 -Rel. Des. Renato Nalini, j. 10.11.2011)

Saliente-se que, julgando inconstitucional legislação do Estado do Rio de Janeiro, que – assim como a legislação dos rodeios, “autorizava” rinhas de galo – entendeu o Supremo Tribunal Federal que:
“A promoção de briga de galos, além de caracterizar prática criminosa tipificada na legislação ambiental, configura conduta atentatória à Constituição da República, que veda a submissão de animais a atos de crueldade, cuja natureza perversa, à semelhança da “farra do boi” (RE 153.531/SC), não permite sejam eles qualificados como inocente manifestação cultural, de caráter meramente folclórico” (STF, ADIN 1856/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, j. 26.05.2011).
A questão da crueldade e sua tentativa de legitimação também não deixou de ser observada pela doutrina.

Paulo Affonso Leme Machado, analisando o teor do artigo 225 da Constituição Federal, asseverou:
“A Constituição teve o mérito de focalizar o tema de proibir a crueldade contra os animais. O texto constitucional fala em ‘práticas’ – o que quer dizer que há atos cruéis que acabam tornando-se hábitos, muitas vezes chamados erroneamente de manifestações culturais”.[12]


3 -  Dos argumentos “econômicos” utilizados em defesa dos rodeios

Ainda no afã de buscar legitimar os rodeios, costumam seus defensores sustentar que seriam importantes eventos de movimentação de atividade econômica, bem como meio de sustento de milhares de famílias.

Por primeiro, de ressaltar que as “festas de peão” envolvem, além dos rodeios, inúmeras outras atividades: shows musicais, feiras agro-industriais e comerciais, parques de diversões, “barracas de prendas”, exposições de animais e casas noturnas, dentre outras. De tais atividades citadas, avultam em importância, no que diz respeito à captação de público, os shows musicais. As referidas festas, pois, podem plenamente se manter – com igual público – ainda que haja exclusão da “atração” rodeio. Em diversos Municípios há já a realização de festas congêneres sem rodeios e sem que isso tenha implicado em redução de público e prejuízos econômicos.

E, para se observar o quão frágil é o “argumento econômico” em defesa do rodeio como captador de público para a festa, basta verificar que, no próprio material oficial de divulgação dos eventos todo o destaque fica, em regra, por conta dos shows musicais, merecendo as “provas”, especificamente, nada mais que mera referência em letras bem diminutas.

Por outro lado, o fato de que diversas pessoas possam “ganhar a vida” ou retirar o sustento de rodeios não é hábil a convencer como “argumento econômico”.

No presente quadro nacional, significativa parcela da população “ganha a vida” e sustenta seus familiares com recursos advindos de meios ilícitos. E nem por isso a respectiva atividade se torna legítima.

Aliás, afastando também o “argumento econômico”, destaca-se outro trecho do já mencionado voto do Des. Lineu Peinado:
“Os argumentos econômicos também devem ser vistos com reservas, porque o tráfico de entorpecentes também se diz rentável e este motivo não é suficiente, aliás, no exemplo, é vil, para não combate-lo com absoluto rigor”. (TJSP, Agravo de Instrumento n. 77.320-5/7, Rel. Des. Lineu Peinado)
Na mesma linha, e em acórdão que também entendeu pela configuração de crueldade na prática dos rodeios, o voto condutor de lavra do Des. Renato Nalini:

“Por tudo isso, não há se argumentar que a decisão vulnera os valores da livre iniciativa e do livre trabalho, pois os particulares não dispõem dessa liberdade absoluta para se conduzir no mercado de produção de bens e serviços da forma que bem lhes aprouver. A Constituição Federal fundou a ordem econômica brasileira na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, mas impôs aos agentes econômicos a observância de várias diretivas, dentre as quais a defesa do meio ambiente não é menos importante - artigo 170, inciso VI, da CF. Isso quer dizer que o bem não pode ser produzido, o serviço não pode ser prestado, e a atividade não pode ser desenvolvida, sem a estrita observância da legislação ambiental”. (TJSP, Apelação Cível n. ° 9229895-64.2003.8.26.0000 -Rel. Des. Renato Nalini, j. 10.11.2011)




4 – Do “argumento social”

Além das ponderações já lançadas em relação à inaceitabilidade dos argumentos “histórico-cultural” e “econômico”, fato é que não raro se levanta, quando em discussões sobre a prática dos rodeios, a ideia de uma suposta “superficialidade” das preocupações com animais, num pais de gritantes desigualdades sociais.
Por sorte, este tema foi já abordado pela Corte Suprema, tendo o Ministro Francisco Rezek, ao apreciar recurso extraordinário relativo à “farra do boi”, ponderado que se devia afastar tentação de levar em consideração a “metajurídica das prioridades: por que, num país de dramas sociais tão pungentes, há pessoas preocupando-se com a integridade física ou a sensibilidade dos animais?”. E responde:
“Esse argumento é de uma inconsistência que rivaliza com sua impertinência. A ninguém é dado o direito de estatuir para outrem qual será sua linha de ação, qual será, dentro da Constituição da República, o dispositivo que, parecendo-lhe ultrajado, deva merecer seu interesse e sua busca de justiça. De resto, com a negligência no que se refere à sensibilidade dos animais anda-se meio caminho até a indiferença a quanto se faça a seres humanos. Essas duas formas de desídia são irmãs e quase sempre se reúnem, escalonadamente. Não nos é dado o direito de tentar ridicularizar o pedido, de amesquinhá-lo com esse argumento, sobretudo porque os sofrimentos que ainda hoje, para nosso pesar, em nossa sociedade se infligem a seres humanos, não são assumidos como institucionais: constituem algo de que todos se envergonham e que em muitos casos a lei qualifica como crime. Aqui estamos falando de outra coisa, de algo que é assumido e até chamado de ‘manifestação cultural’. Por isso, a ação não se dirige contra marginais, mas contra o poder público, no propósito de fazê-lo honrar a Constituição” (STF, RE 153.531-8/SC, rel. Min. Francisco Rezek, j. 03.07.1997)




5 – Da vedação à realização de rodeios em áreas urbanas no Estado de São Paulo

Há que se ponderar que, independente da compreensão que se der à temática da crueldade praticada contra animais nas denominadas “provas de rodeio”, tais eventos, por disposição expressa, não podem ser realizados em área urbana – o que parece não estar recebendo a devida atenção do Poder Público.
De fato, dispõe o artigo 23 da Norma Técnica Especial aprovada e anexa ao Decreto Estadual n. 40.400, de 24 de outubro de 1995, que “Artigo 23 – Os haras, os rodeios, os carrosséis-vivos, os hotéis-fazenda, as granjas de criação, as pocilgas, e congêneres não poderão localizar-se no perímetro urbano”.




6 – Da violação a interesses especialmente protegidos

Dispõe a Constituição Federal:

Artigo 23 – é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos  Municípios:
(...)

VI proteger o meio-ambiente (...);

VII – preservar as florestas, a fauna e a flora;

Artigo 225 – Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações

Parágrafo 1º Para assegurar a efetividade deste direito, incumbe ao poder público:
(...) 
Inciso VII - proteger a fauna e a flora, vedadas na forma da lei as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção das espécies ou submetam os animais a crueldade".
(...)
 Na mesma linha, dispositivos da Constituição do Estado de São Paulo:
Art. 193 - "O Estado, mediante lei, criará um sistema de administração da qualidade ambiental, proteção, controle e desenvolvimento do meio ambiente e uso adequado dos recursos naturais, para organizar, coordenar e integrar as ações de órgãos e entidades da administração pública direta e indireta, assegurada participação da coletividade, com o fim de:
  (...)
Inciso X - proteger a flora e a fauna, nesta compreendidos todos os animais silvestres, exóticos e domésticos, vedadas as práticas que coloquem em risco a sua função ecológica e que provoquem a extinção das espécies ou submetam os animais a crueldade, e fiscalizando a extração, produção, criação, métodos, abate, transporte, comercialização e consumo de seus espécimes e subprodutos".

Ressalte-se que maus-tratos e crueldade constituem, hoje, condutas tipificadas pela legislação penal (Lei nº 9.605/98). Ressalte-se, ainda, que o Brasil é signatário da “Declaração Universal dos Direitos dos Animais” (Bruxelas, 1978), que dispõe, em seu artigo 3º, que “nenhum animal será submetido a maus tratos e a atos cruéis” e, em seu artigo 10, que “nenhum animal deve ser usado para divertimento do homem”.




7 – Inconstitucionalidade das Leis Federais ns. 10.519/02 e 10.220/01 e da Lei Estadual n. 10.359/99

Na contramão da História e dos movimentos mundiais e nacionais de proteção ao ambiente e repúdio à submissão de animais a crueldade – com destaque para a recente vedação, para a partir de 1º de janeiro de 2012, de quaisquer touradas na região da Catalunha, Espanha[13] - houve por bem a União editar as Leis ns. 10.519/02 e 10.220/01, e o Estado de São Paulo editar a Lei n. 10.359/99 .

Trata a primeira de “regulamentar” a realização de rodeios de animais, traçando normas gerais de orientação para as práticas ora atacadas. Já a segunda, que a antecedeu, cuida de reconhecer como atleta profissional o peão de rodeio. O diploma estadual “regulamenta” a prática de rodeios em São Paulo.

Todas as três leis, pois, partem do pressuposto de que autorizada seria, por nosso sistema jurídico, a prática de rodeios, e, em última análise (levando em conta tudo quanto já relatado), autorizada seria a crueldade.
Ora, conforme já declinado, consagra a Constituição Federal como poder-dever do Estado (em todas as esferas de Administração) proteger o ambiente e preservar a fauna. Consagra, ainda, serem vedadas as práticas que submetam os animais a crueldade. E contempla como dever do Poder Público a proteção da fauna.

Assim, se é dever do Poder Público a preservação/proteção da fauna, não pode este tolerar (omissão) e, muito menos “autorizar” (ação), ainda que por lei, atividade atentatória à fauna.

Salta aos olhos que, se o Diploma organizador do Estado impõe a este um comando – proteger a fauna – não pode tal Estado, agindo em sentido diametralmente oposto e por diplomas infraconstitucionais, “autorizar” práticas contra ela (a fauna) atentatórias.

O recurso a exemplos torna a conclusão ainda mais inafastável.

O artigo 4º, inciso VIII da Constituição Federal estabelece ser princípio da República o repúdio ao racismo. Note-se que se fala em “princípio” (com uma séria de discussões quanto a se tratar de norma programática), e não ainda em dever. Mesmo assim, e mesmo antes da edição de lei estabelecendo punições para o crime de racismo, por óbvio sequer se poderia cogitar – por flagrante inconstitucionalidade – de edição de lei que autorizasse práticas ou atividades racistas.

O artigo 1º, inciso III, por sua vez, consagra a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado. Ainda que revogadas fossem todas as normas incriminadoras de atentados à dignidade, nem por isso seria dado à União editar lei que “autorizasse” prática reconhecidamente degradante, que afrontasse a dignidade da pessoa humana.

O artigo 5º, inciso XLIII, delega à legislação ordinária considerar hediondo, dentre outros, o crime de tortura. Não há dúvidas de que, mesmo que inexistisse sanção penal para a prática de tortura, não poderia a legislação “regulamentar” a tortura, por exemplo, como procedimento policial investigatório legítimo para obtenção de confissão de crimes.

Mutatis mutandis, inegável que se a Constituição, em diversos pontos, estabelece ser dever do Estado a proteção à fauna, não pode a lei autorizar práticas cruéis contra animais.

O artigo 225, em seu parágrafo primeiro, inciso VII, veda a prática de submissão de animais a crueldade.
E não se diga, neste ponto, que o dispositivo não teria aplicação por delegar à lei a forma de tal vedação. Quis o Constituinte delegar – como não poderia deixar de ser – ao Legislador Ordinário, a forma de vedação das práticas cruéis, isto é, a delimitação de como se sancionaria o descumprimento do comando genérico proibitivo implícito (“é proibido submeter animais a crueldade”).

Quis o Constituinte, portanto, delegar à legislação ordinária a forma de repressão às práticas cruéis: criminalização de atos, forma de imposição de multas em esfera administrativa, regulamentação quanto à concessão de autorizações de pesquisas científicas, etc. – e não a forma de autorização de tais práticas cruéis – como fazem as leis que “autorizam” rodeios.

Os comandos sancionatórios infraconstitucionais já foram, como relatado, editados, ressaltando-se, dentre outros, o que impõe penas criminais a quem “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos” (artigo 32 da Lei n. 9605/98).
Vedou a Constituição as práticas cruéis, delegando à lei ordinária a regulamentação de tal vedação. Em hipótese alguma, pois, autorizou práticas cruéis contra animais.

Neste ponto, oportuno rememorar o voto proferido pelo então Ministro Francisco Rezek no julgamento histórico, no Supremo Tribunal Federal, em que se considerou contrária à Constituição a prática da “farra do boi”, que ocorria no Estado de Santa Catarina (e que era, igualmente, defendida como “manifestação cultural”). Na oportunidade, tratando juntamente do significado da expressão “na forma da lei” no dispositivo em comento, ponderou:

“atentei, de início, na interpretação da regra constitucional, à qualificativa ‘na forma da lei’. Imaginei uma possível crítica à ação onde se dissesse que da própria Carta da República não se tira diretamente um comando que obrigue a autoridade catarinense a agir como pretendem as instituições recorrentes, porque isso deveria ser feito na forma da lei. Ora, a ação é dirigida ao Estado e, portanto, ao legislador também. Ao Estado como expressão do Poder Público. O que se quer é que o Estado, se necessário, produza, justamente para honrar esse ‘na forma da lei’, o regramento normativo capaz de coibir a prática considerada inconsistente com a norma constitucional. Não vi assim nenhuma espécie de falha no encadeamento normativo. Pode-se, efetivamente, invocar o inciso VII do §1º do era. 225 da Carta para, em ação civil pública, compelir o poder público a, legislando ou apenas agindo administrativamente, conforme lhe pareça apropriado, coibir toda prática que submeta animais a tratamento cruel” (STF, RE 153.531-8/SC, rel. Min. Francisco Rezek, j. 03.07.1997). [destaques no original].

Não poderia mesmo ser diferente - embora haja no Brasil, aparentemente, uma equivocada prática, por parte de alguns operadores do Direito, de interpretar a Constituição a partir da legislação infraconstitucional (quando, por óbvio, dever-se-ia proceder do modo inverso).

E aqui se torna aos exemplos. A Constituição Federal, ao determinar que a legislação consideraria hediondo o crime de tortura, e ao delegar também à lei a tipificação do crime de racismo, vedou tais práticas. Mesmo no vácuo legislativo ocorrido entre a promulgação da Carta e a edição das leis incriminadoras, não haveria possibilidade (juridicamente válida) de se editarem leis que incentivassem ou consagrassem práticas racistas, ou que considerassem legítima a tortura como meio de investigação.

Tratam tais casos, ontologicamente, de situações idênticas à ora discutida, exigindo idênticas soluções.
Aliás, oportuno transcrever o teor de decisão do E. Tribunal de Justiça de São Paulo, no sentido de que
"Um certo instrumento, ou uma determinada prova, não deixam de ser cruéis simplesmente porque o legislador assim dispôs. Não se desfaz a crueldade por expressa disposição de lei. Portanto, se demonstrado, em cada caso, que algum dos equipamentos legalmente permitidos no rodeio lesiona, física ou mentalmente, o animal, se impõe sua proibição, para que se cumpra fielmente a vedação à crueldade, assegurada nas Constituições Federal e Estadual. Evidente, em conseqüência, que os rodeios e festas de peão não podem incluir práticas e equipamentos cruéis, ainda que eventualmente permitidos na Lei Estadual 10.359/99, podendo ser assim considerados aqueles que causam lesão, consistente em ferimento, dor física ou sofrimento mental, aos animais." (TJSP, Apelação Cível 168.456- 5/5, j.24.10.2001, Re. Des. Teresa Ramos Marques, j. 24.10.2001).

Superados tais pontos, de ressaltar que, lição basilar de Direito, no ordenamento jurídico as normas infraconstitucionais buscam seu fundamento de validade na Constituição. Só são validas no mundo jurídico se de alguma forma respaldadas na Constituição ou, ao menos, se não conflitarem com as disposições constitucionais.

Assim, ao interpretar a legislação, impõe-se ao operador que perquira se tal conflita – ou não – com os comandos constitucionais. Em caso de conflito, a norma infraconstitucional é desprovida de validade. Trata-se do princípio da supremacia da Constituição, fundamental no Estado Democrático de Direito.
A isto se acrescente vigorar, ainda em sede de interpretação (constitucional), o princípio da efetividade ­– deve-se dar aos comandos positivados na Carta (in casu, imposição de dever ao Estado de proteger a fauna e, via de consequência, vedação a que compactue e autorize práticas atentatórias à fauna; vedação às práticas que submetam animais a crueldade) o sentido que lhes garanta maior efetividade. Neste sentido, aliás, a lição do mestre português José Joaquim Gomes Canotilho:

“Este princípio, também designado por princípio da eficiência ou da interpretação efectiva, pode ser formulado da seguinte maneira: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia se lhê dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais, e, embora sua origem esteja ligada à tese da actualidade das normas programáticas (THOMA) é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (no caso de dúvida, deve preferir-se a interpretação que reconheça a maior eficácia aos direitos fundamentais).”[14]

Tal princípio – da efetividade – representa, aliás, nada mais que consagração, em sede de interpretação constitucional, do velho brocado commodissimum est, id accipi, quo res de qua agitur, magis valeat quam pereat (“prefira-se a inteligência dos textos que torne viável seu objetivo, ao invés da que os reduz à inutilidade”).

Demonstrado, com fundamento em estudos técnico-científicos, que todas as modalidades compreendidas no rodeio consistem em submissão dos animais a crueldade.  

Demonstrado que pela Constituição Federal foram vedadas práticas que impliquem em crueldade contra animais, bem como que imposto ao Estado o dever de proteção a tais animais, não sendo dado a este (Estado) autorizar, ainda que por lei, práticas cruéis contra animais. Assim, inevitável reconhecer que inconstitucionais as Leis Federais e a Lei Estadual apontadas, “autorizadoras” da atividade do rodeio.
E, se inconstitucionais, são como que inexistentes, não produzindo qualquer efeito, quanto mais o de autorizar a prática de rodeios:

“Um ato ou uma lei inconstitucional é um ato ou uma lei inexistente; uma lei inconstitucional é lei aparente, pois que, de fato ou na realidade, não o é. O ato ou lei inconstitucional nenhum efeito produz, pois que inexiste de direito ou é para o Direito como se nunca houvesse existido”[15].

Aliás, em recente decisão, a Corte Paulista reconheceu, incidentalmente, a inconstitucionalidade das leis apontadas:

“A despeito da Lei Estadual 10.359/99 regulamentar a prática da atividade de rodeio e a Lei Federal 10.519/02, por sua vez, regular as provas de laço, é indubitável que tais atividades causam sofrimento aos animais que protagonizam as apresentações, considerando-se que utilizam o sedem e outros petrechos a fim de ‘estimular’  os animais. Dessa forma, estes diplomas legais são inconstitucionais”.(TJSP, Apelação n° 0006162-86.2009.8.26.0457, Rel. Des. Ruy Alberto Leme Cavalheiro, j. 28.04.2011) [destaquei].
E, apreciando caso semelhante, decidiu o E. Supremo Tribunal Federal pela inconstitucionalidade de leis estaduais dos Estados do Rio Grande do Norte e do Rio de Janeiro que – à semelhança da legislação que “autoriza” os rodeios - “autorizava” as igualmente cruéis rinhas de galo:

“INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Lei nº 7.380/98, do Estado do Rio Grande do Norte. Atividades esportivas com aves das raças combatentes. "Rinhas" ou "Brigas de galo". Regulamentação. Inadmissibilidade. Meio Ambiente. Animais. Submissão a tratamento cruel. Ofensa ao art. 225, § 1º, VII, da CF. Ação julgada procedente. Precedentes. É inconstitucional a lei estadual que autorize e regulamente, sob título de práticas ou atividades esportivas com aves de raças ditas combatentes, as chamadas "rinhas" ou "brigas de galo (STF, ADIN 3776/RN, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 14.06.2007)
EMENTA: CONSTITUCIONAL. MEIO-AMBIENTE. ANIMAIS: PROTEÇÃO: CRUELDADE. "BRIGA DE GALOS". I. - A Lei 2.895, de 20.03.98, do Estado do Rio de Janeiro, ao autorizar e disciplinar a realização de competições entre "galos combatentes", autoriza e disciplina a submissão desses animais a tratamento cruel, o que a Constituição Federal não permite: C.F., art. 225, § 1º, VII. II. - Cautelar deferida, suspendendo-se a eficácia da Lei 2.895, de 20.03.98, do Estado do Rio de Janeiro (STF, ADIN 1856 MC/RJ, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 03.09.1998).


8 – Da novidade trazida pelo Código de Proteção aos Animais do Estado de São Paulo

Em boa hora o Estado de São Paulo editou a Lei Estadual n° 11.977/05, que instituiu o Código de Proteção aos Animais do Estado,  dispondo expressamente em seu artigo 22 que "são vedadas provas de rodeio e espetáculos similares que envolvam o uso de instrumentos que visem induzir o animal à realização de atividade ou comportamento que não se produziria naturalmente sem o emprego de artifícios."

Bem interpretado, não se pode chegar a conclusão diversa da de que tal lei veda o uso de sedéns, peiteiras, sinetes, esporas e congêneres[16].

Desaparece, aqui, uma das principais linhas de defesa dos organizadores de rodeios – a de que tais instrumentos não causariam dor, mas apenas “cócegas” ou, quando muito, “incômodo”.

Embora tais hipóteses (de mero incômodo) sejam de todo afastadas por estudos técnicos, fato é que, ao menos no Estado de São Paulo, mesmo um simples “incomodo” passou a ser vedado, sendo claro que, ainda que não causem dor – o que se admite apenas por amor à argumentação – inegavelmente provocam nos animais reação (saltos, corcoveios, etc.) “que não se produziria naturalmente sem o emprego de artifícios”[17].




9 – Princípio da precaução

De qualquer forma, ainda que existentes alguns estudos em sentido contrário ao sustentado neste artigo, imperioso que se impeça o prosseguimento das atividades, em atenção ao princípio da precaução.

Tal princípio impõe que, em caso de incerteza científica, não se pratique a atividade danosa. Cuida-se de princípio in dúbio pro natura.


Nesta linha, aliás, o entendimento constante de outro acórdão do E. Tribunal de Justiça, cuja ementa se pede vênia para transcrever:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - RODEIO - Obrigação de não fazer - Sentença que julgou improcedente o pedido sob o argumento de o mesmo ser genérico e amplo - Inadmissibilidade - O pedido deve ser parcialmente provido como medida de prevenção e proteção ao bem estar dos animais, conforme os pareceres do Ministério Público em Ia e 2a grau - Contundência dos laudos e estudos produzidos a comprovar que a atividade do rodeio submete os animais a atos de abuso e maus tratos, impinge-lhes intenso martírio físico e mental, constitui-se em verdadeira exploração econômica da dor - Incidência do art. 225, § 1º, VII, da Constituição Federal, do art. 193, X, da Constituição Estadual, além do art. 32 da Lei n° 9.605/98, que vedam expressamente a crueldade contra os animais - Inadmissível a invocação dos princípios da valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, pois a Constituição Federal, embora tenha fundado a ordem econômica brasileira nesses valores, impôs aos agentes econômicos a observância de várias diretivas, dentre as quais a defesa do meio ambiente, e a conseqüente proteção dos animais, não são menos importantes - Condenação do apelado (...) na obrigação de não fazer para que se abstenha de realizar provas de rodeio em festivais/eventos (bulldogging, team roping, calf roping e quaisquer outras de laço e derrubada), e ainda para que se abstenha de realizá-las em treinos e aulas na Fazenda, sob pena de aplicação de multa diária - Apelo parcialmente provido. Em verdade, sequer haveria necessidade dos laudos produzidos e constantes dos autos para a notória constatação de que tais seres vivos, para deleite da espécie que se considera a única racional de toda a criação, são submetidos a tortura e a tratamento vil. Ainda que houvesse fundada dúvida sobre o fato do sofrimento e dor causados aos animais utilizados em rodeios - dúvida inexistente diante da prova colacionada -,incide na espécie o princípio da precaução, segundo o qual "as pessoas e o seu ambiente devem ter em seu favor o beneficio da dúvida, quando haja incerteza sobre se uma dada ação os vai prejudicar", ou seja, existindo dúvida sobre a periculosidade que determinada atividade representa para o meio ambiente, deve-se decidir favoravelmente a ele - ambiente - e contra o potencial agressor. CONFERE-SE PARCIAL PROVIMENTO AO APELO”. (TJSP, Apelação n° 0013772-21.2007.8.26.0152,Rel. Des. Renato Nalini, j. 31.03.2011) [destaquei].

Na mesma linha:

“Com efeito, a documentação existente nos autos demonstra que as provas denominadas bulldog, laço de bezerro e laço em dupla, pelas características com que são encetadas, provocam dores e sofrimentos aos animais a elas submetidos, o mesmo ocorrendo com as provas que utilizam esporas pontiagudas, chicotes e o denominado sedem, instrumento especialmente imaginado para produzir dores na região pélvica dos animais, fazendo os pular. Basta, para tanto, ler a descrição das provas (bulldog, laço de bezerro e laço em dupla), desnecessários maiores conhecimentos científicos para auferir a dor sentida pelo animal. Aliás, conforme muito bem lembrado pelo digno Procurador de Justiça oficiante às fls 698/713 em seu brilhante parecer, a co-ré (...) admitiu em sua peça de contestação a possibilidade de ocorrência de dor, sofrimento e traumas nos animais envolvidos, apenas mencionando que não se constituem como regra, se observadas as conseqüências concretas das provas quanto aos animais Nem se diga que existem estudos que informam a inexistência de evidências concretas no sentido de que os aparelhos mencionados (esporas pontiagudas, chicotes e o denominado sedem) e as provas indicadas (bulldog, laço de bezerro e laço em dupla) causem dor e sofrimento, porquanto os princípios da precaução e da prevenção, que norteiam todas as ações em termos ambientais, prevenindo e banindo a simples possibilidade de dano, permitem vetar tais práticas tão só com observância dos estudos que demonstram a existência de crueldade. Vale dizer que em âmbito de meio ambiente e trato com animais e outros seres da fauna brasileira, não há necessidade de que esperem os jurisconsultos e cientistas pelo perecimento do animal exaurido pelo sofrimento para atestar o mau trato que lhe foi infligido, bastando que se permitam antever de forma razoável e lógica o sofrimento que dele advirá para embasar a proibição ao ato.” (TJSP, APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 669.217-5/8-00, Rel. des. Regina Capistrano, j. 08.11.2007) [destaquei].



10 – Pedidos

A prática de crueldade – como visto, vedada e que, portanto, não poderia ser “autorizada” por lei - há que ser combatida.

Pode-se optar – como se fez em alguns municípios paulistas – pela via legislativa, com a edição de leis locais que vedam os rodeios em seu território.
No entanto, nem sempre Executivo e Legislativo são sensíveis à questão – e, em alguns casos, contrariando dever constitucional, antes de combaterem a prática vedada, saem os municípios em sua defesa.

Nestes casos, outra via não resta que não a judicial.

A forma que tem se revelado bastante eficaz é a ação do Parquet. Agindo sponte propria, ou mediante provocação[18], tem o Ministério Público ajuizado, com significativo sucesso, ações civil públicas contra os rodeios. Nestes casos, inegável que a ação ministerial tem a vantagem de contar com amplo banco de dados – seja de peças processuais, seja de laudos e pareceres arquivados nos Centros de Apoio.Também não têm sido raros os casos de ajuizamento de ações civis públicas por organizações de defesa dos animais.

Pode ainda o cidadão valer-se da ação popular.
Independentemente da via processual utilizada, pode-se – a título de exemplo – pleitear (tanto em antecipação dos efeitos da tutela quanto como pedido definitivo) a procedência do pedido para, cumulativamente:

a)                  condenar o Município em obrigações de não fazer, consistentes em não realizar, autorizar ou permitir a realização de rodeios e quaisquer congêneres no perímetro urbano, nos termos o artigo 23 da Norma Técnica Especial aprovada e anexa ao Decreto Estadual n. 40.400, de 24 de outubro de 1995, sendo certo que, em caso de realização de eventos na zona rural, deverão ser observadas todas as restrições impostas na ação;

b)                 condenar o Município em obrigações de não fazer, consistentes em não realizar, permitir ou autorizar a realização de rodeios e quaisquer congêneres que impliquem no uso de sedéns, cordas e congêneres – quaisquer que sejam os materiais constitutivos - peiteiras, sinos, choques elétricos ou mecânicos e esporas de qualquer tipo e ainda que sem rosetas ou com pontas rombas;

c)                  condenar o Município em obrigações de não fazer, consistentes em não realizar, permitir ou autorizar a realização de provas congêneres, tais como calf roping, team roping, bulldogging e vaquejatas, ou ainda outras que impliquem variações no que tange às técnicas de laçada, lançamento ou agarramento de animais, bem como outros eventos semelhantes que envolvam maus-tratos e crueldade a animais;

d)                 condenar o Município em obrigação de fazer, consistente em tomar medidas efetivas para coibir a realização das práticas referidas nos itens anteriores, inclusive, se necessário, através de cassação de alvarás, interdição de atividades, embargos e acionamento judicial, dentre outras;

e)                  fixar multa correspondente a (estipular o valor) para cada dia de realização de qualquer dos eventos acima citados, sem prejuízo da responsabilização pessoal do Chefe do Executivo pelo débito aludido e consequentes danos causados ao Erário, e sem prejuízo da atuação de outros órgão ou instituições para impedir a realização dos eventos, sendo certo que valor referido será devido ainda que não realizado o evento quando, por comprovada inércia do Município, outro órgão ou instituição tenha que ter tomado providências para impedir a realização.




11 - Conclusão

Os rodeios têm aceitação de uma parcela da população que, é de se presumir, desconhece por completo os danos físicos e fisiológicos causados nos animais.

A submissão de animais a crueldade – in casu, para mero deleite – é prática vedada pela Constituição, sendo, por isso mesmo, inconstitucionais as leis que “autorizam” ou “regulamentam” os rodeios.
Encampando tais perspectivas – e dando adequada interpretação à Constituição – o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vem, reiteradamente, decidindo pela vedação total ou parcial das provas, tendo, inclusive, já reconhecido, incidentalmente, a inconstitucionalidade das leis “autorizadoras”.

Caso, agora, de se levar a questão ao Supremo Tribunal Federal – que, infelizmente, não tem apreciado a matéria de fundo, por entender que se trataria de violação constitucional apenas reflexa – a fim de permitir a unificação da jurisprudência e, quiçá, um novo histórico julgamento, em moldes semelhantes àquele em que se entendeu contrariar a Constituição a denominada “farra do boi”.



Índice de Fontes (Laudos, Pareceres e Acórdãos)

Bortoli, Dirceu de, Laudo de Perito Forense, (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
Matera, Júlia Maria, Parecer Técnico sobre a potencialidade lesiva de sedém, peiteiras, sinos, choques elétricos e mecânicos e esporas em cavalos e bois (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).

Orlandi, Vanice Teixeira,  Cruéis Rodeios – a exploração econômica da dor (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo)

Prada, Flávio, Parecer de Assistente Técnico apresentado na Comarca de Jaboticabal (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo)

Prada, Irvênia Luiza de Santis, Diversão humana e sofrimento animal – Rodeio (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo)

Prada, Irvênia Luiza de Santis et alli, Bases Metodológicas e neurofuncionais da avaliação de ocorrência de dor/sofrimento em animais, Revista de Educação Continuada, CRVM-SP, vol.5, fascículo 1, p.1-13, 2002).

Superior Tribunal de Justiça
RESP 363-949/SP, Rel. Min. Franciulli Netto, j. 18.03.2004

Supremo Tribunal Federal

ADIN 1856 MC/RJ, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 03.09.1998

ADIN 3776/RN, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 14.06.2007

ADIN 1856/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, j. 26.05.2011

RE 565.257/SP, Min. Ellen Gracie, j. 02-03-2011

RE 153.531-8/SC, rel. Min. Francisco Rezek, j. 03.07.1997

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Agravo de Instrumento n. 77.320-5/7, Rel. Des. Lineu Peinado

Apelação Cível n. 143.729-5/9, rel. Des. Geraldo Lucena, v.u

Apelação Cível n. 122.093-5/1, rel. Des. Clímaco de Godoy, v.u

Apelação Cível 539.402-5/9, Rel. Des. Samuel Junior, j.29.11.2007

Apelação Cível n. ° 9229895-64.2003.8.26.0000 -Rel. Des. Renato Nalini, j. 10.11.2011

Apelação Cível 168.456- 5/5, j.24.10.2001, Re. Des. Teresa Ramos Marques, j. 24.10.2001

Apelação n° 0006162-86.2009.8.26.0457, Rel. Des. Ruy Alberto Leme Cavalheiro, j. 28.04.2011

Apelação n° 0013772-21.2007.8.26.0152,Rel. Des. Renato Nalini, j. 31.03.2011

Apelação com Revisão n° 669.217-5/8-00, Rel. des. Regina Capistrano, j. 08.11.2007

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Notas

[1] Publicado originalmente pela Associação Paulista do Ministério Público em 17.05.2012 (www.apmp.com.br), o presente artigo trata-se de versão atualizada do texto em que se consubstanciaram iniciais de ação civil pública, de lavra do autor, ajuizadas em Comarcas do interior do Estado de São Paulo a partir do ano de 2003.
[2] Cf. Vanice Teixeira Orlandi, Cruéis Rodeios – a exploração econômica da dor (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo) e .Irvênia Luiza de Santis Prada, Diversão humana e sofrimento animal – Rodeio (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
[3] Cf. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2003.
[4] Cf. Júlia Maria Matera, Parecer Técnico sobre a potencialidade lesiva de sedém, peiteiras, sinos, choques elétricos e mecânicos e esporas em cavalos e bois (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
[5] Cf. Irvênia Luiza de Santis Prada, Diversão humana e sofrimento animal – Rodeio (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
[6] Cf. Irvênia Luiza de Santis Prada, Flavio Massone, Arif Cais, Paulo Eduardo Miranda Costa e Marcelo Marcondes Seneda, Bases Metodológicas e neurofuncionais da avaliação de ocorrência de dor/sofrimento em animais, Revista de Educação Continuada, CRVM-SP, vol.5, fascículo 1, p.1-13, 2002.
[7] Dirceu de Bortoli, Laudo de Perito Forense, (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
[8] Cf. Flávio Prada, Parecer de Assistente Técnico apresentado na Comarca de Jaboticabal (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
[9] Irvênia Luiza de Santis Prada, Diversão humana e sofrimento animal – Rodeio (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
[10] Vanice Teixeira Orlandi, Cruéis Rodeios – a exploração econômica da dor (Parecer arquivado no Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado de São Paulo – área de atuação Urbanismo e Meio-Ambiente, mimeo).
[11] Os casos mais próximos que disso se tem, absolutamente temporários, são os do processo de doma de cavalos xucros, sem o uso de instrumentos modificantes, e, uma vez domado o animal, não há mais saltos ou corcoveios, estabelecendo-se entre homem e cavalo uma (para lá de histórica) relação de troca e equilíbrio, e não um combate em que um deles – ou ambos – sairá ferido.
[12] Paulo Affonso Leme Machado, Direito Ambiental Brasileiro, 20ª Ed., São Paulo, Malheiros, 2012, p. 167.
[13] Cf. Sarah Rainsford, Região espanhola da Catalunha proíbe touradas, in BBCBrasil, 28.07.2010, disponível em www.bbc.uk/portuguese , acesso em 17.04.2012.
[14] José Joaquim Gomes Canotilho , Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, Almedina, 1989, p. 162. Sobre o mesmo tema, veja-se ainda Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional,Coimbra, Coimbra Editora, 1983, tomo II, pp. 229 e segs.
[15] Cf. Francisco Campos, Direito Constitucional, v. I/430, apud José Afonso da Silva, Direito Constitucional Positivo, São Paulo,  Malheiros, 2009, p. 55.
[16] Na mesma linha do texto quanto à caracterizar o emprego dos instrumentos aludidos crueldade contra animais, confira-se o trabalho de Karina Keiko Kamei, Alguns fundamentos para a efetiva proteção dos animais utilizados em rodeios, mimeo, trabalho no qual se propõe uma alternativa à utilização a tais instrumentos, qual seja, o emprego, em montarias, de animais xucros, (disponível em http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_urbanismo_e_meio_ambiente/biblioteca_virtual/bv_teses_congressos/Dr%20Karina%20Keiko%20Kamei.htm, acesso em 29.04.2012)
[17] Observe-se que, além da proibição, por lei estadual, do uso de instrumentos que provocam dor ou sofrimento, diversos municípios paulistas editaram leis vedando a prática do rodeio em seu território. Em levantamento realizado em 2011, apurou-se que, somadas as proibições por lei municipal e aquelas oriundas de decisão judicial, ao menos em 35 (trinta e cinco) municípios no Estado de São Paulo os rodeios já são proibidos. (fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ribeirao/16581-interior-ja-proibiu-rodeios-em-34-, cidades.shtml, reportagem de Gabriela Yamada, acesso em 02.02.2012).
[18] O interessado pode, por exemplo, apresentar representação ao Promotor de Justiça que, em sua Comarca, tenha atribuições na área do meio ambiente, descrevendo os danos aos animais e solicitando providências. Nestes casos, e salvo hipótese de indeferimento da representação,  pode se seguir a instauração de inquérito civil para apuração dos fatos ou, mesmo, o pronto ajuizamento de ação civil pública

FAUSTO LUCIANO PANICACCI
Promotor de Justiça em São Paulo 
Doutorando pela Escola de Direito  
da Universidade do Minho (Portugal) 

Jusnavegandi

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